19.6.10

Ele tinha parado, uma engrenagem encravada, mas sempre em esforço. Um esforço gigantesco, um arfar, uma fome que não apaziguada se esquece.

Desfiava amizades, páginas de livros, horas de trabalho, sempre confidente na constância do movimento, da sua presença em si mesmo.

Um dia lembrou-se de ouvir-se no tempo e o silêncio assustou-o.

Bad trip existencial.
Já tantas vezes repetida. É difícil ser na idade do homem moderno, do super-homem. Porque o super-homem nasceu e morreu com segundos de intervalo.
Existem memórias, percursos; hoje estandardizados, taylorizados, múltiplos de passados.

Hoje chorei o tempo. Lágrimas-espada que destroem as falsas actividades valorativas com pretensões apaziguadoras. A verdade, o Real, são apenas caixas dentro de caixas.

As nuvens correm atrasadas; entre elas o azul do céu surge em farrapos. É isso mesmo. Ter visão gama, ultrapassar as nuvens, a agitação troposférica, o magnetismo capitalista, darwinista.

Palavras, palavras, palavras na idade dos porquês. Os jovens saem de casa aos trinta. Talvez me tenha enganado ali em cima; o homem, afinal, pode ser, hoje em dia. Ou talvez não. Mas isso são ninharias. Nunca aceitámos a nossa organicidade.

2 comentários:

João Roque disse...

Belíssimo texto.
Quem não se reconhece, de alguma forma, em certos parágrafos dele?

Heartbeats disse...

Obrigado pinguim,

É pena é só conseguir escrever a rotura, a crise. Gostava de escrever o optimismo.

Abraço